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Mulheres Radicais: Arte Latino-americana, 1960-1985

Por Angela Nogueira
junho 30, 2018
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Até 22 de julho no Brooklyn Museum, New York

De 18 de agosto a 19 de novembro de 2018, Pinacoteca, São Paulo

O bairro do Brooklyn (NY) atrai cada vez mais os visitantes que buscam relaxar e desejam experimentar a sensação de ver o tempo passar, deixando para trás a agitação da frenética e atraente Manhattan. E uma ida ao Brooklyn Museum torna-se obrigatória, não só pela sua excelente coleção, mas também pela abordagem não ortodoxa adotada nas últimas décadas que tornou seu público significativamente mais jovem e mais diversificado e integrado por uma expressiva parcela de membros de grupos minoritários. Em 2007, o Brooklyn Museum, de forma inovadora, inaugurou o Elizabeth A. Sackler Center for Feminist Art, primeiro espaço público deste tipo no país com a missão de exibir a arte feminista e explorar seu significado e influência através de uma ampla gama de programas públicos (para saber mais sobre o Centro, clique aqui).

E por isso, nada mais natural que o Brooklyn Museum recebesse a exposição Radical Women: Latin American Art, 1960-1985, que já passou pelo Hammer Museum de Los Angeles, organizador inicial da exposição como parte do Pacific Standard Time: LA / LA, um evento que reuniu uma série abrangente de exposições  com foco na arte latino-americana e latina, por iniciativa do Getty e instituições artísticas do sul da Califórnia.

O foco desta exposição é dar visibilidade às práticas artísticas de artistas mulheres da América Latina, sejam elas de origem latina ou que tenham herança latina, abrangendo os anos de 1960 a 1985. Este foi um período de forte repressão política e social na maior parte dos países da América Latina, mas por outro lado, anos de uma extraordinária experimentação conceitual e estética no campo da arte, onde as artistas representadas deram contribuições de extremo valor à arte contemporânea. Muitas delas são pioneiras em formas radicais e exploram uma sensibilidade feminina com ligações explícitas ou, mais frequentemente, encobertas ao ativismo feminista.

Entretanto, muito pouca atenção acadêmica foi dedicada a situar o trabalho dessas artistas dentro dos contextos sociais, culturais e políticos em que foi feito. Esta exposição inovadora ocupa assim um vácuo histórico da arte, constituindo-se na primeira genealogia de práticas artísticas feministas e radicais na América Latina e sua influência internacional. São 123 artistas de 15 países, pioneiras nas formas que expressaram o empoderamento feminino, muitas vezes em desacordo com os regimes opressivos em seus países ou de valores patriarcais profundamente enraizados. São mais de 260 obras que incluem fotografia, vídeo, performances e outros meios experimentais, bem como pinturas, esculturas e gravuras.

Estão presentes na exposição, expoentes da arte contemporânea brasileira, como Lygia Clark, Lygia Pape, Anna Bella Geiger, Claudia Andujar, Martha Araujo, Teresinha Soares, Josely Carvalho, a pioneira em videoarte Leticia Parente, a artista-fotógrafa Ana Vitória Mussi, que se unem a tantas outras figuras internacionais da América Latina.

A escolha das artistas e seus trabalhos foi produto de uma pesquisa minuciosa conduzida pelas co-curadoras Cecilia Fajardo-Hill e Andrea Giunta, ambas especialistas no campo da arte latino-americana. Elas perceberam que pouca atenção havia sido dada para posicionar a arte latino-americana feita por mulheres nos contextos social, cultural e político. Elas iniciaram a pesquisa em 2010, com um plano inicial de cobrir o período de 1945-1980, mas tiveram de optar pela redução ao período de 1965-1980 quando já haviam selecionado cerca de 300 obras. E então, elas decidiram focar a exposição ao tema do “corpo político”. Na elaboração desse projeto, três questões as guiaram: 1. O que havia acontecido com essas artistas e seus trabalhos? 2. Quais eram as circunstâncias culturais, políticas e ideológicas que levara à omissão e até mesmo o desaparecimento das obras? 3. Qual a natureza da contribuição dessas artistas?

“É muito importante dar voz a uma cultura que foi apagada” (Andrea Giunta).

Essas perguntas nos levam a um espaço específico da exposição que me chamou atenção por me transportar historicamente para o período em que essas artistas desenvolveram suas obras: uma linha do tempo que situa a luta feminista no contexto político e social de cada um dos países latino-americanos. É extremamente chocante observarmos que, o direito mais básico de um cidadão, o direto ao voto, só foi concedido muito recentemente às mulheres de alguns países latinos. Imaginem que no Paraguai, somente em 1961 as mulheres puderam votar!

Organizei a linha do tempo reunindo todos os países com os anos em que as mulheres passaram a ter o direito de voto em seus países e me dei conta de que, em alguns deles, no ano em que nasci, esse direito não lhes era acessível.

Se quiser saber mais sobre os acontecimentos mais marcantes em cada país, no final do post estão exibidas as imagens dessa linha do tempo de  cada um deles.

Ao escrever essas histórias não contadas, as pesquisadoras adotaram uma abordagem feminista, embora reconheçam que o movimento feminista não era tão relevante na América Latina como era nos EUA. Mesmo que muitas dos temas que elas discutem e articulam possam ser vistas como feministas, esses temas assumem um sentido mais amplo porque contestam princípios patriarcais da sociedade latino-americana.

“As mulheres tinham que fazer parte do movimento revolucionário para mudar a sociedade como um todo e não estar trabalhando particularmente pelos direitos das mulheres”, explicou Andrea Giunta. “Mas mesmo que elas não estivessem propondo seu trabalho como arte feminista, elas faziam parte de um momento cultural feminino mais amplo.”

As obras são de uma diversidade incrível, tanto na forma de expressão como no uso de suportes e mídias. É uma exposição inerentemente política, mas de ressonância bastante poética, com muitas das artistas questionando direitos civis, direitos humanos, autonomia do corpo, violência de gênero e opressão social. As investigações são conduzidas por suas experiências individuais, em condições culturais muito diferentes, mas que ao mesmo tempo, revelaram temas que atravessam fronteiras, enfatizando a experiência compartilhada do corpo e seu papel como participante ativo na mudança política.

“O corpo feminino sempre foi representado como o corpo nu. Mas essas artistas desarticulam essa noção. Elas falam da emancipação do corpo não só em termos políticos, mas também de sexualidade. Transformam o corpo em lugar democrático.”  (Andrea Giunta)

As pesquisadoras organizaram as obras segundo nove temas: Self-portrait, Body Landscape, Performing the Body, Mapping the Body, Resistance and fear, Power of words, Feminisms, Social Places, Erotic. Esses temas não se expressam de forma estanque e podem se apresentar de forma transversal em várias das obras. No entanto, a seção reservada ao Feminismo é apenas para as artistas que explicitamente se consideram feministas.

E para quem se interessar mais profundamente pela pesquisa, as informações podem ser vistas no link abaixo, da Library da UCLA, onde esses temas são explicados e são listadas as artistas que realizaram trabalhos a ele relacionados, com links para informações individualizadas de cada uma.

http://guides.library.ucla.edu/c.php?g=722848&p=5153828

Ao entrarmos na exposição, somos atraídos de imediato pelos gritos cheios de energia vindos nos de uma tela no alto onde é exibida a vídeo-performance da coreógrafa, compositora e ativista afro-peruana Victoria Santa Cruz (1922-2014), conhecida por ter fundado a primeira companhia de teatro negra no Peru no final dos anos 1950. “Me gritaron negra!” (1979) é uma poderosa declaração de sua identidade como uma mulher negra junto com um coro de três homens, três mulheres e um tambor de caixa de madeira. Nesta performance Victoria recupera a lembrança da infância em que, aos sete anos, foi chamada de preta pela primeira vez na rua e, mais tarde, abraçando sua negritude como uma fonte de orgulho. Forçando vigorosamente as palavras “¿Y qué?” (E daí?), ao ritmo das palmas das mãos, o que também coloca seu corpo em movimento, a artista conclama ao empoderamento e orgulho negro. Clique aqui para ver o vídeo no youtube: https://youtu.be/bZBHvMaTiuU

Logo ao lado, uma instalação composta de uma máquina de som e de luz de neon vermelho meio pálido, ambos pulsando para os batimentos cardíacos da artista peruana Teresa Burga, denuncia as maneiras pelas quais os indivíduos são desumanizados e convertidos em informações numéricas e controláveis por um sistema ditatorial.  Teresa Burga é uma artista que renuncia às formas tradicionais de representação no autorretrato. Nascida em 1935, ela fazia parte de uma cena emergente da vanguarda peruana associada à arte pop e formas experimentais de representar o meio ambiente. “Untitled (Heartbeat recording and light)” é uma versão inicial de um elemento de “Autoretrato”, no qual o artista usa fotografias, desenhos, registros médicos e gravações para documentar seu corpo.

Seguem mais algumas das impactantes obras exibidas nesta exposição ímpar.

“Hora y media”, 1975 (Lourdes Grobet, México, 1940), Foto Angela Nogueira

Com este trabalho, a artista propôs uma transgressão radical do sentido fotográfico (preservação do momento capturado através da luz impressa no papel) como uma metáfora eloquente da invisibilidade da artista mulher. Seus gestos lembram a Vênus de Botticelli, mas ela escolhe estar vestida, uma versão deliberada e não-objetiva dela.

“O tema do corpo tem sido uma constante em meu trabalho artístico. Eu o trato de duas maneiras: a formal (imagens de nudez) e a conceitual, onde meu próprio corpo tem sido o meio e o conteúdo. Eu tomo muito cuidado com a fotografia de nudez para que ela não se levada ao extremo do clichê. Entre algumas das minhas performances em que meu corpo foi o instrumento, me vem a mente “Hora e meia”. Nela eu me tornei o elemento da imagem; fui fotografada saindo de uma caixa de papel metálico, imprimi essas imagens na frente do público (a galeria foi montada como um quarto escuro). Impressas as fotos, pendurei-as na parede e acendi a luz; as imagens duraram alguns segundos e sumiram.” (Lourdes Grobet)

“Waiting”, 1983, Josely Carvalho (Brasil).  Foto Angela Nogueira / A obra faz parte da série de trabalhos “In the Shape of a Woman” / Na Forma da Mulher (1970-1986),

“A viagem começa pelo feminino. O contorno da mulher delineia meu percurso, o alicerce de minhas pesquisas. O corpo feminino como primeiro mapa, primeiro dado geográfico. Feminino, a um só tempo, local e universal. As cenas se multiplicam e se desfazem em fragmentos de experiências vividas, presenciadas, sentidas. A câmera fotográfica é meu instrumento de documentação. A serigrafia, meu pincel.” Josely Carvalho (Diário de Imagens, 2016)

Una niña muere por inanición, 1971, Nirma Zárat (Colômbia). Foto Angela Nogueira

Nosotros, 1971, Nirma Zárat (Colômbia). Foto Angela Nogueira

Nirma Zárate (1936-1999), artista colombiana, integrou o coletivo Taller 4 Rojo que nos anos 70 desenvolveram uma arte comprometida com as causas sociais, denunciando a desigualdade, a pobreza, a violência, a violação de direitos humanos na Colômbia. Com uma linguagem néo-figurativa, ela desenvolveu uma série de serigrafias com foco na vulnerabilidade de crianças que viviam em extrema pobreza em seu país. A artista é pioneira no uso da técnica de fotoserigrafia numa época em que predominavam as técnicas de gravação em madeira e metal.

“Pregnant woman in a ball of yarn”, 1978, Barbara Carrasco (EUA). Foto Angela Nogueira

A muralista e pintora Barbara Carrasco, baseada em Los Angeles, explora a identidade “chicana” aliada a sua experiência pessoal de lutas sociais e políticas. A obra “Mulher grávida num novelo de lã” foi criada numa noite em 1978, ao descobrir que seu irmão havia impedido a esposa de frequentar a universidade por estar grávida. Criada por uma mãe liberal, a artista não poderia jamais aceitar tal fato. Esta pequena obra, porem potente, sofreu ameaças de censura por parte de curadores de uma exposição de 1990 na galeria da Universidade da Califórnia, que a consideraram ofensiva e sexista.

Obras da série “Envolvimento”, 1979, Wanda Pimentel (Brasil)

Os personagens femininos de Wanda Pimentel aparecem fragmentados, em espaços de caráter doméstico fragmentados, onde objetos ganham vida e o corpo feminino parece se desumanizar entre eles, tornando-se também objeto. Essa relação revela, no trabalho da artista, uma crítica à sociedade de consumo e ao período de intensa repressão sexual e de ideias no contexto da ditadura militar no país. É também um momento chave da emancipação feminina, do qual a artista utiliza-se para tratar da representação do corpo a partir do olhar de uma mulher que reivindica, mesmo que de forma sutil, o lugar do feminino na arte. O corpo retratado assim retratado reforça os questionamentos sobre a anulação da subjetividade feminina e a representação do corpo da mulher como objeto de desejo do olhar masculino.

“Self-portrait”, 1962, Marisol / “Autoretrato” é um exemplo clássico da abordagem satírica da Pop Art praticada pela artista Marisol. A figura de um corpo com 7 cabeças, dois seios, dois braços e várias pernas, anatomicamente impossível, representa p corpo social absurdo, fazendo referência às mulheres na sociedade de consumo.

São muitas as obras e as referências, por isso, uma sugestão: vá com tempo para poder se debruçar sobre as histórias dessas “radicais“ mulheres e agradecê-las por esta especial oportunidade. Impossível não sair impactada desta exposição que nos mostra uma produção exuberante, desafiadora e inovadora, num período em que sobreviver era a preocupação maior dessas artistas, verdadeiras heroínas, mães extremadas que foram capazes de salvaguardar suas “crias artísticas”, documentando um período da história latino-americana que não pode ser jamais esquecido.

Para saber mais sobre a exposição: 

Brooklyn Museum: https://www.brooklynmuseum.org/exhibitions/radical_women

Hammer Museum: https://hammer.ucla.edu/exhibitions/2017/radical-women-latin-american-art-1960-1985/

Entrevista com curadora: https://hyperallergic.com/415046/cecilia-fajardo-hill-on-radical-women-latin-american-art-hammer-museum/

Vídeo da exposição: https://youtu.be/gaaxCpQVXK0

As artistas brasileiras Lenora de Barros e Regina Silveira falam sobre sua participação na mostra: https://www.select.art.br/artistas-falam-sobre-radical-women/

Pinacoteca (São Paulo): http://pinacoteca.org.br/programacao/radical-women-latin-american-art-1960-1985/

Não deixe de ler também o post sobre o Elizabeth A. Sackler Center, no Brooklyn Museum. Clique aqui!

Contexto político e social de cada um dos países latino-americanos – linha do tempo

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